O que se sabe sobre o caso de espionagem da Abin contra autoridades do Paraguai 1w6t19
Invasão hacker contra autoridades paraguaias gerou 'mal-estar diplomático', com suspensão de negociações e convocação de embaixador 473l1u
Espionagem da Abin contra autoridades paraguaias gerou crise diplomática, com suspensão de negociações sobre tarifas de energia da Usina de Itaipu e convocação do embaixador brasileiro em Assunção para explicações.
A divulgação de um caso de espionagem da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) contra autoridades do Paraguai, confirmado pela Polícia Federal, provocou uma crise diplomática, que culminou com a convocação do embaixador brasileiro em Assunção para prestar esclarecimentos, além da suspensão das negociações sobre tarifas de energia elétrica gerada pela Usina de Itaipu. 4x1e4i
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O caso veio à tona com a partir de uma reportagem sobre uma ação hacker implementada pela Abin contra as autoridades paraguaias, divulgadas inicialmente pelo jornalista Aguirre Talento.
O planejamento da operação teria começado durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), mas contou com a autorização do atual diretor da agência brasileira, Luiz Fernando Corrêa, no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A operação teria contado com a invasão a computadores para a obtenção de informações sigilosas ligadas à negociação de tarifas da usina hidrelétrica binacional, alvo de disputa comercial entre Brasil e Paraguai.
Um servidor da Abin que participou diretamente da ação divulgou o planejamento executado em depoimento à Polícia Federal. Outro agente também teria confirmado a existência da ação à PF.
A ação teria ocorrido em maio de 2024, meses antes do Governo Federal celebrar um novo acordo sobre valores pagos ao Paraguai por energia comercializada ao Brasil. Não foram explicadas, no entanto, se as informações obtidas foram usadas para favorecer o Brasil na negociação.
Entenda a dinâmica da espionagem 4v4k5r
A Polícia Federal investiga o caso no âmbito do inquérito que apura desvios da 'Abin paralela', na gestão do ex-diretor Alexandre Ramagem, durante o governo Bolsonaro, com possível uso da estrutura da agência contra opositores políticos do então presidente.
O caso, no entanto, também levantou suspeitas de irregularidade sob a gestão do atual diretor.
De acordo com o agente, a ação usou um programa chamado Cobalt Strike, utilizado para invasão de sistemas informáticos: "O objeto da operação era a obtenção dos valores que seriam negociados do anexo C dos valores de venda de energia produzida por Itaipu".
A ação não aconteceu a partir do Brasil, mas de servidores virtuais instalados no Chile e no Panamá, montados por agentes da Abin, relatou o servidor.
O agente afirmou que os alvos eram autoridades relacionadas diretamente à 'negociação e aos valores a serem cobrados por megawatt'. Foram invadidos os sistemas do Congresso do Paraguai, Câmara e Senado, e da Presidência da República.
A ação contou com a captura de senhas e dados 'de cinco ou seis' autoridades paraguaias, disse o servidor à PF. As informações seriam usadas para a captura de dados sensíveis sobre as negociações sobre Itaipu. As identidades das vítimas, bem como data da operação, não foram reveladas.
Ação teve aval de diferentes diretores 2t1u47
Ainda no depoimento, o servidor da Abin revelou que o planejamento foi aprovado pelo então diretor Victor Carneiro, que sucedeu Ramagem no cargo, já no fim do governo Bolsonaro. Contudo, a ação também contou com o aval de diretores seguintes, incluindo o atual, Luiz Fernando Corrêa.
O agente diz ter 'apresentado pessoalmente' a ação para Corrêa. "Luiz Fernando teria vibrado, gostou muito, que era a primeira vez que se sentia numa atividade de inteligência", afirmou à PF.
Delegado aposentado e ex-diretor da Polícia Federal no segundo mandato de Lula, Corrêa foi nomeado pelo petista à direção da Abin em 2023.
O Terra tenta posicionamento de Victor Carneiro e da direção da Abin sobre o caso. O espaço segue aberto para manifestação.
Represália do Paraguai 3zh2g
Além da convocação do embaixador brasileiro José Antonio Marcondes de Carvalho para prestar esclarecimentos em Assunção, o governo paraguaio também suspendeu a negociação relativa ao Anexo C do Tratado de Itaipu.
O dispositivo se refere à divisão de energia assinada entre Brasil e Paraguai em 1973, estabelecendo bases financeiras de comeciação do excedente de energia elétrica, dividada igualmente entre os países. Contudo, como a demanda do Paraguai é menor, parte de sua energia é vendida ao Brasil.
O tratado também previa uma revisão dos valores das tarifas de energia e condições de venda em 2023. O diálogo acontece em meio à pressão paraguaia para que o Brasil aumente o valor pago pela energia excedente do vizinho.
As tratativas chegaram a uma resolução em 2024, em um acordo entre Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia, e Santiago Peña, presidente do Paraguai. Na ocasião, o Brasil aceitou o aumento da tarifa paga, mas em valor menor ao que foi pedido pelos paraguaios.
Marcondes de Carvalho recebeu do vice-chanceler Víctor Verdún uma cobrança formal de explicações detalhadas, por meio de nota oficial. O embaixador paraguaio em Brasília, Juan Ángel Delgadillo, também foi chamado para consultas em Assunção.
Em coletiva, Peña anunciou uma investigação sobre possíveis vulnerabilidades e eventos de intrusão no período que o governo brasileiro itiu ter feito a operação.
"A intromissão em assuntos internos, por um país em outro, é uma violação do direito internacional", afirmou o ministro de Relações Exteriores Rubén Ramírez Lezcano, que deferiu a suspensão das negociações sobre o tratado de Itaipu até 'receber esclarecimentos satisfatórios'.
Governo Lula reconhece espionagem, mas culpa Bolsonaro 2v294g
Após o caso vir à tona, o governo Lula reconheceu a espionagem, mas afirmou que a operação aconteceu durante o governo de Jair Bolsonaro e foi interrompido após a posse de Corrêa à frente da Abin.
Em nota divulgada nesta segunda-feira, dia 31, o Itamaraty reconheceu que a operação ocorreu e foi interrompida quando a direção da Abin nomeada por Lula tomou conhecimento do caso.
"A citada operação foi autorizada pelo governo anterior, em junho de 2022, e tornada sem efeito pelo diretor interino da Abin em 27 de março de 2023, tão logo a atual gestão tomou conhecimento do fato", disse o Ministério das Relações Exteriores.
"O atual diretor-geral da Abin encontrava-se, naquele momento, em processo de aprovação de seu nome no Senado Federal, e somente assumiu o cargo em 29 de maio de 2023". O Itamaraty também negou que o presidente Lula tenha dado aval à operação.
"O governo do presidente Lula desmente categoricamente qualquer envolvimento em ação de inteligência, noticiada hoje, contra o Paraguai, país membro do Mercosul com o qual o Brasil mantém relações históricas e uma estreita parceria", disse o MRE.
"O governo do presidente Lula reitera seu compromisso com o respeito e o diálogo transparente como elementos fundamentais nas relações diplomáticas com o Paraguai e com todos seus parceiros na região e no mundo."
*Com informações de Estadão Conteúdo.